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06/07/20
Fábio Flores*
No dia 18/06/2020 foi publicada a Portaria nº 1.369, de 16 de junho de 2020, que institui, no âmbito do Ibama, a Equipe Nacional de Instrução (ENINS) de processos de apuração de infrações ambientais, regulamenta o seu funcionamento, dispõe sobre normas procedimentais complementares e dá outras providências.
A ENINS tem por finalidade instruir, preparar e relatar processos de apuração de infrações ambientais, inclusive pedidos de revisão de sanções, para serem submetidos a julgamento pelas autoridades de primeira e segunda instâncias administrativas.
Trata-se de medida que visa garantir a razoável duração do processo e adoção de medidas que assegurem a celeridade processual, com criação de setor especializado nas atividades de instrução, preparação e relatoria de processos administrativos, com a uniformização de entendimentos administrativos e padronização de atos processuais e seus respectivos documentos.
Com isso, busca-se obter proatividade, produtividade e eficiência, evitando a ocorrência de prescrição intercorrente nos processos administrativos.
A portaria prevê, para observância de celeridade processual, que a decisão cabível deverá ser proferida no prazo máximo de trezentos e sessenta dias contados do oferecimento de defesa ou interposição de recurso, ressalvados os casos de manifesta impossibilidade (art. 2º, parágrafo único).
Essa norma não prevê a aplicação para os processos já em curso e que não tenham decisão proferida, pelo que deve ser aplicada aos processos novos.
A ENINS será constituída pelo Grupo Nacional de Primeira Instância (GN-I), pelo Grupo Nacional de Segunda Instância (GN-II) e pelo Grupo Nacional de Preparação (GN-P).
É previsto que o integrante que tiver participado dos atos de instrução que antecederam a decisão recorrida não poderá atuar em recurso interposto ao GN-II (art. 6º, §2º). Trata-se de regra de impedimento, tal qual prevista no Código de Processo Civil, para evitar a quebra do dever de imparcialidade capaz de causar a nulidade da decisão.
Caberá ao GN-I, precipuamente, as atividades de instrução, destinadas a averiguar e comprovar a ocorrência de infração ambiental descrita em auto de infração e a caracterização da responsabilidade administrativa, e a elaboração de relatório circunstanciado com proposta de decisão objetivamente justificada, indispensável ao julgamento que cabe à autoridade de primeira instância administrativa (art. 11).
Ao GN-II compete as atividades de instrução complementar, se necessárias, e a relatoria de recursos com proposta de decisão objetivamente justificada,
indispensável ao julgamento que cabe à autoridade de segunda instância administrativa (art. 12).
Ao GN-P, responsável pela gestão do acervo de processos de apuração de infrações ambientais, distribuição e comunicação de atos processuais, compete: recepcionar, conferir e classificar os processos, bem assim identificar os casos conexos e prioritários; distribuir os processos, observadas as competências, prioridades, conexões e matérias, com base no Plano de Trabalho da Enins; movimentar os processos para as áreas pertinentes; adotar providências relativas à juntada de documentos; expedir certidão de julgamento; registrar nos sistemas institucionais as decisões exaradas pelas autoridades julgadoras; comunicar: a) a determinação relativa à regularização da representação processual; b) a possibilidade de manifestação em alegações finais ou sobre o Relatório de Análise Instrutória Complementar; c) os indicativos de agravamento da penalidade por reincidência e majoração ou aumento de multas indicadas ou consolidadas; d) a realização de diligências ou a produção de provas; e) as decisões interlocutórias e revisionais exaradas; e f) ao agente autuante, preferencialmente, a decisão declaratória de nulidade de auto de infração, observado o disposto no § 1º do art. 100 da Instrução Normativa Conjunta n.º 2, de 2020.
Competirá à unidade administrativa responsável pela ação de fiscalização, preferencialmente ao agente autuante, a decisão que declara a regularidade ambiental de área, obra ou atividade, condição indispensável à revogação de medidas administrativas cautelares.
As notificações de julgamentos realizados pelas autoridades de primeira e segunda instâncias administrativas e de atos de cobrança de créditos administrativos atinentes às multas ambientais serão realizadas pelas Divisões de Administração e Finanças (Diafi) das Superintendências do Ibama e pelo Serviço de Cobrança Administrativa de Taxas e Autos de Infração (Secat), em conformidade com as instruções expedidas pela Coordenação de Cobrança Administrativa e Processo Fiscal (Cprofi).
Os integrantes da ENINS serão designados pelo Presidente do IBAMA, após recomendação da Ciam (Coordenação de Apuração de Infrações Ambientais) e oitiva da unidade na qual o servidor está lotado, e ficarão suspensos de seus cargos, independentemente de qualquer formalidade, enquanto exercerem a função de autoridade julgadora no âmbito do processo de apuração de infrações ambientais ou ocuparem o cargo de coordenador da Ciam ou estar no exercício deste como substituto.
O integrante da ENINS ocupante de cargo comissionado, ou designado para o exercício de função da mesma natureza, cumprirá metas compatíveis e proporcionais aos encargos e atividades sob sua responsabilidade.
O parágrafo único do art. 18 prevê, expressamente, a observância das regras de impedimento e suspeição previstas nos arts. 18 a 20 da Lei n.º 9.784, de 1999, aos servidores da ENINS, que deverão se abster de atuar em processo administrativo em que tenha interesse direto ou indireto na matéria; tenha participado ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou
se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o terceiro grau; ou esteja litigando judicial ou administrativamente com o interessado ou respectivo cônjuge ou companheiro. Em quaisquer dos casos, deverá comunicar o fato à autoridade competente.
Além disso, será suspeito o integrante que tenha amizade íntima ou inimizade notória com algum dos interessados ou com os respectivos cônjuges, companheiros, parentes e afins até o terceiro grau.
São deveres dos integrantes da ENINS: observar o devido processo legal e as normas que tutelam o meio ambiente; propor a imposição ao administrado de penalidade ou tratamento em conformidade com a lei, razoável e proporcional; abster-se de divulgar publicamente posicionamento sobre autuação ambiental ainda não julgada (ressalvada a manifestação em obras acadêmicas, científicas ou no exercício do magistério); respeitar as orientações institucionais e não emitir posicionamento em desacordo com expressa disposição de lei; cumprir as metas fixadas no Plano de Trabalho; garantir o cumprimento de ordens judiciais e apresentar subsídios à defesa do Ibama sobre temas pertinentes à instrução e o julgamento de autuações ambientais; dentre outros.
É vedado ao integrante da ENINS, sob pena de exclusão: descumprir deveres ou atribuições estabelecidos neste Regulamento ou nas normas que regem o processo de apuração de infrações ambientais do Ibama; procrastinar a prática de atos processuais; reter a carga processual por prazo superior a seis meses, sem praticar o ato cabível ou determinar a providência necessária; indicar penalidade notoriamente demasiada, por mero intuito de insatisfação pessoal ou sentimento vingativo; deixar de comunicar impedimento ou suspeição, ou não se abster de praticar atos processuais nessas condições; deturpar a ordem de análise ou instrução processual sem respeitar os casos prioritários estabelecidos em leis ou normas; e deixar de cumprir, reiteradamente, as metas de produtividade estabelecidas.
O requerimento de revogação de medida administrativa cautelar fundado na comprovação de regularidade ambiental de área, obra ou atividade, deverá ser encaminhado à área responsável pela ação fiscalizatória para decisão, sem prejuízo do curso normal do procedimento e a análise do mérito da autuação ambiental.
O integrante do GN-I, ao constatar a necessidade de esclarecimentos sobre aspectos fáticos ou técnicos relativos à autoria, à materialidade, ao nexo de causalidade, a circunstâncias atenuantes e majorantes e às causas extintivas da punibilidade, requisitará informações ao agente autuante ou solicitará manifestação, de uma só vez, à área especializada sobre o ponto a ser elucidado ou melhor instruído, salvo se das respostas surgirem novos pontos a serem esclarecidos.
Encerrada a instrução, o integrante do GN-I expedirá Relatório de Análise Instrutória, que enfrentará todas as teses de defesa apresentadas e ainda abordará ao menos: os elementos que evidenciam autoria, materialidade e nexo de causalidade; vícios sanáveis ou insanáveis, se existentes; a existência de causa extintiva da punibilidade; a subsunção do fato ao tipo infracional
correspondente; a caracterização das circunstâncias que agravam, majoram ou atenuam a pena; as razões acerca da razoabilidade e proporcionalidade de sanções a serem impostas; a conformidade legal das medidas administrativas cautelares aplicadas; e o deferimento de pedido de conversão de multas em prestação de serviços ambientais, caso deduzido.
Nota-se uma preocupação com a fundamentação adequada da decisão no processo administrativo, com observância do contraditório e ampla defesa, devendo o integrante do GN-I enfrentar todas as teses de defesa, o que presume exigir fundamentação positiva (porque acolhe) e negativa (porque não acolhe).
A motivação, aliás, é objeto de seção própria (Seção II – arts. 31 a 34), com previsão de que seja explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.
Expedido o Relatório de Análise Instrutória, o integrante do GN-I declarará encerrada a fase de instrução e determinará a notificação sobre a possibilidade de manifestação em alegações finais no prazo de dez dias corridos (art. 66, §2º, da Lei n.º 9.784, de 1999).
Após a apresentação de alegações finais, o integrante do GN-I elaborará Relatório Circunstanciado com proposta de decisão objetivamente justificada antes de encaminhar o processo para decisão pela autoridade julgadora de primeira instância administrativa.
A instrução processual poderá ser reaberta, excepcionalmente, para esclarecer ponto específico não abordado no Relatório de Análise Instrutória, onde o autuado será notificado para, no prazo de dez dias, manifestar-se sobre o Relatório de Análise Instrutória Complementar apresentado.
Proferida decisão de primeira instância, o processo será remetido ao GN-P para providências e após será encaminhado à área competente para a notificação do julgamento realizado.
Em caso de recurso hierárquico, a Portaria prevê a possibilidade de retratação da autoridade julgadora de primeira instância que, no prazo de cinco dias, poderá reconsiderar a sua decisão. Decorrido o prazo, ou não havendo retratação, o processo será imediatamente restituído ao GN-P, sendo vedado à autoridade julgadora de primeira instância emitir juízo de admissibilidade de recurso hierárquico.
O integrante do GN-II, observado o disposto no art. 105 da Instrução Normativa Conjunta n.º 2, de 2020, elaborará Relatório Recursal com proposta de decisão objetivamente justificada antes de encaminhar o processo para a autoridade julgadora de segunda instância administrativa.
É admissível a produção de provas ou a realização de diligências, antes da expedição do Relatório Recursal, em que o autuado será notificado para, no
prazo de cinco dias, manifestar-se sobre a prova produzida ou o resultado da diligência realizada, com a possibilidade de dilação de prazo até o dobro, mediante comprovada justificação.
No caso de pedido de aumento do valor da multa ou reconhecimento de circunstância que agrave a situação do recorrente por parte do integrante do GN-II, o autuado será notificado para, no prazo de dez dias, oferecer impugnação. Após, o integrante do GN-II emitirá o Relatório Recursal.
Proferida a decisão de segunda instância administrativa, o processo será remetido ao GN-P para providências, devendo ser encaminhado à área competente para a notificação do julgamento realizado, e a coisa julgada administrativa será certificada nos autos do processo e registrada no sistema institucional e, se o caso, serão adotadas as providências necessárias à cobrança de crédito administrativo definitivamente constituído.
O requerimento de revogação de medida administrativa cautelar apresentado após o julgamento definitivo da autuação ambiental será encaminhado para apreciação pela autoridade ambiental competente, qual seja, a unidade administrativa responsável pela ação de fiscalização, preferencialmente ao agente autuante.
Por fim, o processo de apuração de infração ambiental cuja etapa de instrução tenha sido concluída antes da edição da Instrução Normativa Conjunta n.º 2, de 2020, poderá prescindir da emissão de Relatório Circunstanciado ou Relatório Recursal e as decisões proferidas pelas autoridades julgadoras de primeira e de segunda instâncias administrativas deverão contemplar os elementos de motivação definidos para o Relatório Circunstanciado e o Relatório Recursal, respectivamente.
*Fábio Flores é sócio do Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados