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06/04/20

Empresas aceleraram acordos com empregados e sindicatos para evitar fechamento e desemprego

O GLOBO (06/04/2020) – Na sexta-feira, um dia após o anúncio da Medida Provisória (MP 936) que permite redução de salários e de jornada em troca de manutenção de empregos, empresas de todo o país já registravam uma série de acordos individuais e coletivos com trabalhadores e sindicatos para garantir que os negócios não fechem por completo. Ao mesmo tempo, o número de reclamações sobre falta de medidas de segurança sanitária em meio à pandemia do coronavírus por parte dos trabalhadores, também tem aumentado.

–  Já estamos celebrando cem acordos por dia, seja de adequação de jornada, salário, antecipação de férias ou uso de banco de horas ou para atender a nova MP. E as consultas direta dos trabalhadores, que eram de cinco a dez por dia, está chegando, agora, a 300 telefonemas por dia – afirmou Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo (SECSP) e presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT).

Maurício Tanabe, sócio do Campos Mello Advogados, destaca que os acordos celebrados estão sendo realizados por necessidade das empresas. Ele alerta que são precisos alguns cuidados especiais ao fechar esses acordos, uma vez que há um movimento de alguns juristas que veem pontos da MP 936 que podem ter sua constitucionalidade questionada, como a autorização para acordos individuais para redução de jornada e salários. Nestes casos, diz, o melhor é fazer um acordo o mais abrangente possível, para ter flexibilidade no futuro.

– O que mais me chamou a atenção é que os sindicatos estão muito abertos à negociação. Não tivemos negativas de acordo até agora, pelo contrário, somente pedidos de algumas questões, como a ampliação do tempo de garantia de emprego após as medidas e aumento de vale-alimentação ou que a empresa assuma valores caso a contraparte do governo atrase – disse Tanabe.

Tanabe conta que muitas empresas já começaram a redução de jornada nesta segunda-feira, das empresas que fizeram os acordos na sexta-feira. Mas, até o momento, não foi publicada a portaria do Ministério da Economia que regularizaria esta comunicação. Sem esta norma, amplia um pouco a insegurança das empresas. Ele afirma que já há ao menos um caso dfe sindicato revendo a sinalização de acordo que havia sido fechado na sexta-feira, para evitar o peso político de aceitar redução salarial.

– Continuamos com a orientação para que as empresas tentem ratificar com os sindicatos os acordos individuais, para ter mais segurança jurídica -disse.

Muitos acordos ocorreram antes mesmo da MP, mas já prevendo a possibilidade do que se aventava na MP: redução de jornada com redução proporcional de salário. Juarez Soriano de Mello, sócio do Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff – Advogados, por exemplo, firmou vários destes acordos antes mesmo da MP, mas prevendo pontos que foram contemplados pela legislção. Agora ele defende que as empresas tentem, ao máximo, fazer o acordo coletivo, para ter mais segurança jurídica. Ele acredita que, aos poucos, os sindicatos estão se conscientizando disso:

– O acordo individual, além do risco de ser contestado na Justiça, é mais rígido, tem que seguir as normas da MP. No acordo coletivo os sindicatos tem conseguido alguns extras, como um percentual maior da contrapartida da empresa, um abono, uma cesta básica. Nestes acordos todos podem ganhar – afirmou Soriano de Mello.

Segurança

Elisângela Mardegan Matsune, advogada do Sindicato dos Lojistas do Comércio de São Paulo (Sindilojas-SP), espera para esta segunda-feira um grande movimento de pedidos de acordo. Entretanto, ela alerta que a MP 936, apesar de válida, ainda precisa de normas do Ministério da Economia para criar o sistema de notificação de acordos, necessário para que as flexibilizações trabalhistas fiquem totalmente em vigor.

Entre os trabalhadores que estão na ativa, a grande preocupação é com a segurança. Advogados, sindicalistas e procuradores afirmam que não há, no momento, muitas denúncias sobre a falta de licença para pessoas dos grupos de risco ficarem em casa. Mas há, por outro lado, muitos questionamentos sobre a falta de medidas que possam reduzir as chances da contaminação dos empregados que seguem na ativa.

Somente no Ministério Público do Trabalho (MPT) do interior de São Paulo foram 400 denúncias desde o dia 20 de março. Advogados e empregadores afirmam que a quantidade de normas e leis surgidas nos últimos dias gera uma preocupação adicional. Somente a Procuradoria-Geral do Trabalho editou nove normas técnicas e quatro recomendações em março.

– A gente tem acompanhado, mas a doença é muito nova, pouco se conhece dela, e então as normas mudam constantemente – disse Márcia Kamei López Aliaga, procuradora-regional do trabalho e coordenadora nacional da Coordenadoria de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho do Ministério Público do Trabalho.

Taís Carmona, sócia-diretora da Lee, Brock, Camargo Advogados (LBCA), afirma que nestes momentos é preciso acompanhar as mudanças de legislação com todo o cuidado, estabelecer bons canais com os empregados e usar o bom senso.

– A atenção nestes momentos é fundamental, pois não só as normas, mas toda a realidade, muda a todo o momento – disse.

Violações

Em março, o Ministério Público do Trabalho recebeu mais de 3 mil denúncias de violações trabalhistas relacionadas ao novo coronavírus. Segundo o procurador-geral do Trabalho, Alberto Balazeiro, cerca de metade dessas medidas estão relacionadas a ações sanitárias voltadas à preservação da saúde dos trabalhadores e cidadãos que com eles tenham contato durante a execução de suas atividades profissionais.

Em uma das denúncias feitas a Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério da Economia, funcionários de uma empresa de telemarketing narram que dois operadores foram afastados da empresa por suspeita de Covid-19, mas que nenhuma medida de prevenção foi tomada, como distribuição de máscaras.

Segundo Balazeiro, uma das grandes preocupações do MPT é com relação a segurança do trabalhador durante e depois da pandemia. As experiências internacionais da China e de outros países têm sido monitoradas pelo órgão, a fim de agregar novas ações de proteção ao trabalhador.