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19/09/22
Por Fernando Facury Scaff*
Sete entre cada dez eleitores ainda não definiram o voto para deputado, a menos de 15 dias das eleições.
Você lembra em quem votou nas últimas eleições gerais, em outubro de 2018? A maioria responderá pensando nos cargos de presidente ou de governador. Talvez um ou outro lembre em quem votou para as duas vagas no Senado, mas seguramente apenas uma ínfima minoria recordará em quem votou para deputado.
É quase certo que 2 de outubro próximo o quadro se repetirá. Você possivelmente já escolheu em quem votará para presidente e governador; ainda está em dúvida quanto ao voto para senador, porém ainda não definiu em quem votará para deputado federal e estadual. Possivelmente decidirá no dia da votação, a caminho da urna.
Além dessa pouca preocupação com o voto no Legislativo (deputados e senador), existe o fato de que ocorrem em turno único, o implica em dizer que não haverá “repescagem”, nem mesmo na disputa para o Senado, que é majoritária — isto é, a votação do dia 2 de outubro representa o primeiro turno das eleições para o Executivo, mas é o turno único das eleições legislativas.
Eis o ponto: todos sabemos que as leis são feitas no Poder Legislativo, mas damos muito pouca atenção às eleições para as casas legislativas; todavia, todos temos que obedecer às leis que nelas são aprovadas.
Nesses últimos quatro anos, nosso Congresso Nacional aprovou diversas normas e assumiu posições, umas boas e outras nem tanto — cada qual julgue como quiser. Tivemos a reforma da lei do saneamento básico e o bloqueio de dezenas de pedidos de impeachment, que sequer foram apreciados. Foi aprovada mais uma reforma previdenciária, ao mesmo tempo em que foram pedalados os precatórios federais. Foi aprovada a PEC Emergencial e criado o orçamento secreto, que beneficia os parlamentares. Foram vastamente ampliados os recursos do fundo eleitoral. E muito mais. Só de Emendas Constitucionais foram 26, em três anos e meio. Começou com a EC 100, que tornou obrigatória a execução das emendas parlamentares de bancada, em junho de 2019, sendo a mais recente a EC 125, que criou requisitos para admissibilidade de processos pelo STJ, em julho de 2022.
Olhe para o Legislativo de seu estado e verifique o que nele foi feito nos últimos quatro anos. Veja quais deputados ou lideranças brigaram pelas causas que são simpáticas a você. Dois exemplos paulistas: foi durante essa legislatura que a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) decidiu pela manutenção dos recursos no caixa da Fapesp, bem como criou uma espécie de ICMS com alíquotas móveis, semelhante ao IPI.
Estas normas/decisões não decorreram de votações unânimes, logo, veja quem votou em um sentido ou outro e alinhe-se conforme melhor lhe aprouver. Só não fique indiferente, pois isso lhe impactará diretamente. Afirmar que estamos em um binarismo eleitoral, como escreveu Alexa Salomão, é pertinente na eleição para presidente e governador em vários estados, mas não se aplica para as disputas legislativas, nas quais é enorme o leque de opções.
É preciso dar mais atenção às disputas para os Legislativos, pois lá são feitas as leis que obrigarão a todos nós. Você é contra ou a favor do aumento dos tributos? Isso será decidido no Legislativo. Reforma tributária ou reforma administrativa? É pauta do Legislativo. E por aí vai.
É no Legislativo que se concentra (ou deveria se concentrar) a fiscalização dos atos do Executivo. Isso foi bastante corrompido pelo orçamento secreto, criado pelo atual presidente e seguido por muitos governadores.
A partir desse olhar é possível até mesmo, com seu único voto, tentar balancear o jogo de poder. Veja só: (1) caso você queira que o presidente/governador a ser eleito tenha “vida fácil” no Legislativo, vote de forma alinhada, isto é, em todos do mesmo grupo político. Em sentido oposto, (2) caso você pense que é melhor que o Legislativo se oponha a qualquer iniciativa do Executivo, mesmo as que aparentemente sejam boas, vote desalinhado, ou seja, em grupos políticos opostos para Executivo e Legislativo. Existe ainda (3) a possibilidade de análise federativa do poder, votando em grupos políticos iguais ou diversos para presidente e para governador.
Além disso, e extremamente importante, é que você paga o salário dessa turma toda, e de seus assessores, que muitas vezes são obrigados a fazer “rachadinhas” com o parlamentar com o qual trabalham.
Uma imagem demonstra o risco: é como entrar em um restaurante, comer mal e ainda pagar uma conta cara — e ser obrigado a fazer isso durante quatro anos, todos os dias.
Portanto, preste atenção e não desperdice o voto no parlamentar de sua preferência política.
Fernando Facury Scaff é professor titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP), advogado e sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Bentes, Lobato & Scaff Advogados.
Texto originalmente publicado na Revista Consultor Jurídico em 19 de setembro de 2022.